Os corredores das escolas foram expandidos nos últimos anos. E não, eu não estou falando de nenhuma reforma da estrutura física dos nossos prédios. Cada dia mais, a rotina escolar é pertubada por provocações, intimidações e difamações das mais variadas nascidas em grupos e redes sociais virtuais.
Segundo um levantamento do Instituto Ipsus, o Brasil é o segundo país com mais casos de cyberbylling do mundo. Diante desse contexto, as escolas brasileiras enfrentam novos desafios em sua missão de proporcionar um ambiente educacional seguro. A legislação não apenas impõe penas mais rígidas para práticas prejudiciais à integridade de crianças e adolescentes, mas também levanta reflexões sobre a responsabilidade das instituições de ensino e das famílias na prevenção e combate ao cyberbullying.
Nós precisamos entender as implicações da nova lei, explorar seus detalhes e analisar as responsabilidades das escolas e famílias torna-se essencial para garantir uma implementação eficaz, promovendo, assim, um ambiente educacional mais saudável e protegido.
No cenário atual, marcado pelo avanço tecnológico e a crescente presença digital, a proteção de crianças e adolescentes contra a violência virtual tornou-se uma prioridade para o governo brasileiro. Recentemente, a sanção da Lei nº 14.811/2024 trouxe consigo uma série de modificações nas penas para crimes cometidos em ambientes virtuais, abordando desde a criação de comunidades que induzem ao suicídio até o alarmante fenômeno do cyberbullying. Estas alterações, publicadas no Diário Oficial da União, já estão em vigor e sinalizam um importante marco legal na busca por um ambiente virtual mais seguro e responsável para as novas gerações.
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O que realmente mudou?
O que mais chama a atenção, e o que já era esperado há algum tempo, foi a inclusão da INTIMIDAÇÃO SISTEMÁTICA (BULLYING e CYBERBULYING) como crime, no Código Penal, nos termos do artigo 146-A, sendo a pena por intimidação sistemática virtual (cyberbullying) de reclusão, de 2 (dois) anos a 4 (quatro) anos, e multa, se a conduta não constituir crime mais grave.
Veja, o cyberbullying é uma das formas mais agressivas de bullying, pois além da propagação das difamações serem praticamente instantâneas, o efeito multiplicador do sofrimento das vítimas é imensurável e, em casos extremos as vítimas são atacadas de forma tão agressiva que são levadas ao suicídio, por isso o legislador trouxe de forma dura suas penalidades, uma vez que a pena de reclusão é aplicada para condenações mais severas.
Como a Escola pode ser responsabilizada por casos de Cyberbullying que ocorram entre os seus alunos?
Inicialmente, é importante destacar que por força das Leis nºs 13.185/2015, 13.663/2018, 14.811/2024 e da própria Lei de Diretrizes e Base, todas as escolas são obrigadas a promover medidas de conscientização, de prevenção e de combate a todos os tipos de violência, especialmente a intimidação sistemática (bullying e cyberbullying) e, ainda, estabelecer ações destinadas a promover a cultura de paz nas escolas.
Como fornecedora de serviços, a Escola tem responsabilidade objetiva pelos seus serviços, isto é, não é necessário comprovar a culpa ou negligência da instituição para que ela seja responsabilizada pelos danos causados em um caso de bullying/cyberbullying.
Então, por exemplo, na hipótese da instituição de ensino não implementar o programa de combate ao bullying/cyberbullying, pode-se dizer que o serviço educacional fornecido é defeituoso e, consequentemente, a escola estará violando o Código de Defesa do Consumidor (artigo 14), o Estatuto da Criança e do Adolescente (artigos 17 e 18), o Código Civil (artigos 186, 927 e 932, inciso IV), sem prejuízo da apuração de eventual responsabilidade criminal dos diretores e mantenedores do colégio (relevância da omissão).
Neste passo, diversas são as situações que a Escola pode ser responsabilizada caso não implemente o programa de combate e fique omissa diante da situação, por exemplo:
Aluna/vítima que leva a direção queixas sobre ofensas constantes em razão de seu sobrepeso ocorridas em grupo de whatsapp de alunos de uma sala de aula, com ameaças de violência física e psíquica. Direção do Colégio alega que não pode fazer nada, pois ocorreu fora do ambiente escolar.
Ness caso, a instituição de ensino tem o dever de garantir a segurança e a proteção dos alunos sob sua direção.
Quais medidas legais podem ser tomadas quando gestores escolares tomam conhecimento de grupos de whatsapp/e outros apps que ocorram Cyberbulling?
A primeira medida que deve ser feita é a convocação dos pais e responsáveis, e dependendo do conteúdo das mensagens, por exemplo, se for um caso de racismo, a Escola deve fazer Notificação ao Conselho Tutelar comunicando os fatos, e dependendo do caso, até um boletim de ocorrência.
A implementação de medidas preventivas contra o cyberbullying nas escolas revela-se crucial diante do cenário desafiador que a era digital impõe às comunidades educacionais. Mais do que simplesmente “apagar incêndios“, a abordagem proativa na prevenção visa criar um ambiente escolar que dissuade atitudes prejudiciais desde a raíz.
Diretores e coordenadores, ao investirem em programas de conscientização e educação digital, capacitam não apenas os alunos, mas toda a comunidade escolar a reconhecer e combater práticas de cyberbullying. Ao abordar o problema em seu cerne, as escolas podem não apenas evitar crises, mas também promover uma cultura de respeito e responsabilidade online.
Prevenção: O Caminho mais Seguro
O programa “Jornada Guardião Digital” surge como um exemplo do compromisso em fortalecer a prevenção ao cyberbullying nas instituições de ensino básico. Ao adotar uma abordagem holística, este programa visa equipar estudantes, educadores e pais com as ferramentas necessárias para compreender, enfrentar e prevenir a violência virtual.
Por meio de intervenções pedagógicas, oficinas, atividades educativas e palestras informativas, o programa aborda não apenas os aspectos técnicos do uso responsável da tecnologia, mas também promove valores fundamentais como empatia, respeito e inclusão digital. Um exemplo disso é a intervenção “Empatia Online“, onde os alunos são convidados a refletir sobre como nós nos comportamos e percebemos as postagens de terceiros em redes sociais. Para além disso:
Essa oficina ainda conta com materia rico para ser trabalhado com pais e famílias sobre como abordar o tema no lar, além de sinais que possam indicar casos de cyberbulling com seus filhos.
A força do “Jornada Guardião Digital” reside não apenas na disseminação de informações, mas na integração de estratégias que envolvem ativamente alunos, professores, diretores e pais. O programa busca fomentar o diálogo aberto, fornecendo canais de comunicação eficientes para relatos e intervenções precoces.
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Sócia da CCFM Advocacia. Atua na área do Direito Cível Educacional, nas esferas contenciosa e preventiva, análise de contratos, processos decorrentes à responsabilidade civil e consumidor, direito digital e palestrante.